Junto com os sem-casa e os sem-Pronatec, excluídos do principal
programa social do governo formam um novo contingente de desvalidos: o daqueles
de quem o Estado, silenciosamente, começou a tirar o que deu.
Primeiro, chega a "cartinha". Com carimbo do Ministério do
Desenvolvimento Social, ela pede ao beneficiário do Bolsa Família que se
apresente na prefeitura da cidade para agendar a visita de um assistente social
à sua casa. A partir desse momento, o dinheiro do programa já para de entrar na
conta da família. Semanas depois, o assistente social toca a campainha.
Prancheta, caneta e almofadinha de carimbo na mão (para os casos em que o
beneficiado não sabe escrever), ele faz perguntas sobre cada morador da casa:
quem estuda, quem trabalha, quanto ganha. Caso note a presença de uma moto, de
uma TV de LED ou de qualquer elemento que destoe do cenário de pobreza
obrigatório, indaga quando a família adquiriu o bem e com que recursos.
Encerrada a entrevista, pede ao beneficiário que assine o formulário preenchido
e encaminha o papel à prefeitura. Feito isso, o resultado é quase sempre o
mesmo: adeus, Bolsa Família. Poucos dos que recebem a visita do assistente
social conseguem manter o benefício.
Sem anúncio nem alarde, o governo federal começou a passar a tesoura
nos programas sociais. O Bolsa Família, carro-chefe da administração petista,
sofreu neste ano o mais profundo corte desde que foi criado, há onze anos.
Apenas no primeiro semestre de 2015, 782.313 famílias deixaram de receber o
benefício.
Para diminuir os custos do programa sem admitir
sua redução, o governo passou a promover um pente-fino silencioso entre os
cadastrados. Desde maio, vem cruzando seus dados com informações do INSS e do
Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), por exemplo. O objetivo é
identificar quem possui bens incompatíveis com o teto de renda permitido aos
participantes do programa (até 154 reais por membro da família, o que torna
difícil a compra de um carro, por exemplo) ou está acumulando benefícios
indevidamente. Os que já recebem a aposentadoria rural de um salário mínimo não
podem ganhar Bolsa Família. Também estão impedidos de integrar o programa
pescadores que recebem o seguro-defeso - pago durante o período de procriação dos
peixes. Esse veto surgiu de uma portaria criada pelo governo federal em março
deste ano. Desde então, em cidades do Nordeste que vivem da pesca, como
Saubara, na Bahia, a queda no número de beneficiários do Bolsa Família foi de
quase 70%.
(revista época)
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